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Deus é um desmancha-prazeres?

Tempo de leitura 8 minutos

Atualizado - fevereiro 9, 2025

Quando se vêem alguns cristãos a andar por aí com um luto sério, poder-se-ia facilmente pensar que Deus deve ser um desmancha-prazeres.

Felizmente, há também outros que estão realmente felizes por o conhecer.

Deus é ou não um desmancha-prazeres?

A vida quotidiana já é suficientemente stressante, pelo menos para muitos de nós. É por isso que ficamos contentes quando chega o fim do dia de trabalho, as crianças já estão aconchegadas na cama e podemos fazer uma pausa pela primeira vez no dia. É ainda melhor quando chega finalmente o fim de semana e pode fazer uma pausa relaxante com a sua família ou dedicar-se ao seu hobby durante algumas horas enquanto as crianças brincam com os filhos dos amigos. Ou quando, antes de ir para a cama, tira alguns minutos para simplesmente olhar para o céu estrelado, cheirar o aroma dos abetos no jardim ou talvez observar os seus animais de estimação a interagir uns com os outros, a brincar, a fazer grooming, a provocar, a brincar às perseguições, etc...

Estas pausas ajudam-nos a ganhar forças para as tarefas do dia a dia, a evitar o esgotamento, a impedir que o nosso corpo puxe o travão de emergência por exaustão, adoeça ou até nos tire de circulação durante mais tempo com um ataque cardíaco.

De vez em quando, pode dar por si a pensar, naqueles momentos realmente calmos e felizes de recarga de baterias: "Não devia estar a fazer isto ou aquilo em vez de estar a olhar para os buracos no ar?" ou "Será correto estar a desfrutar do meu passatempo aqui?"

O que a Bíblia diz?

Provavelmente, toda a gente já ouviu o ditado "Ora et labora!", que significa "Reza e trabalha!". Um leitmotiv da vida cristã que se desenvolveu no final da Idade Média para resumir o modo de vida beneditino. A vida monástica, relativamente isolada do mundo exterior, limitava-se ao trabalho e à oração, razão pela qual o tempo livre devia ser preenchido com a leitura da Bíblia, a fim de evitar o "ócio", como escreveu Bento de Nursia: "O ócio é inimigo da alma".

Pois bem, se Adão e Eva tivessem dado ouvidos à palavra de Deus e não tivessem acreditado nos sussurros de Satanás, o adversário, ainda hoje poderíamos estar a desfrutar do paraíso e a palavra "trabalho" teria provavelmente permanecido desconhecida para nós.

Infelizmente, as coisas mudaram e temos de ganhar a vida a trabalhar. Já interiorizámos isto o suficiente nas nossas vidas.

Os cristãos praticantes estão também conscientes de que devemos estar em contacto diário com Deus para experimentar os seus conselhos, que ele quer que lhe peçamos tudo o que nos aflige, que ele quer dar mais do que aquilo de que precisamos.

Rezar e trabalhar não deveria, portanto, ter permanecido uma questão. Mas o que dizer do tempo livre do trabalho, das tarefas domésticas, dos cuidados com os filhos e muito mais? Será que a Bíblia também nos dá uma resposta para este tema?

Qualquer pessoa que conheça Deus assumirá corretamente que Deus também tomou uma posição sobre este assunto na Bíblia, mas só muito raramente se ouve falar disso nos cultos da igreja, nos estudos bíblicos ou noutros eventos.

Vamos então fazer uma pesquisa e citar duas passagens bíblicas como exemplos:

1 Coríntios 10, 31 diz "Por isso, o que quer que comais ou bebais ou o que quer que façais, fazei-o para honra de Deus.

    e exprime, assim, uma atitude cristã central, que consiste em centrar toda a nossa vida - mesmo nas actividades quotidianas, aparentemente banais, como comer e beber - em Deus e, desse modo, honrá-lo.

    Todas as acções devem, em última análise, fazer parte de uma vida agradável a Deus. O apelo a fazer coisas "frescas" também pode ser entendido como um serviço que honra Deus e ajuda os outros.

    Eclesiastes 9:10 aconselha "O que quer que seja que vos apareça à frente para fazer, façam-no com frescura

    e é um apelo ao vigor, ao sentido de responsabilidade e Alegria de viver - tanto em questões seculares como espirituais.

    Alegria de viver é uma dádiva de Deus que surge através da fé, da gratidão, da esperança e da concentração da nossa vida em Deus. Não é passageiro, mas está profundamente enraizado e também nos transporta através de tempos difíceis. Joie de vivre significa reconhecer a vida em toda a sua plenitude como uma obra de Deus e desfrutá-la com gratidão, paz e confiança.

    Os elementos da alegria de viver bíblica são, por exemplo

    Comunhão com Deus:

    A verdadeira alegria vem de uma relação com Deus. O salmista diz em Salmo 16:11: "Tu mostras-me o caminho da vida. Na tua presença há plenitude de alegria e prazer à tua direita para sempre."
    O próprio Deus é a fonte da alegria de viver.

    Gratidão:

    Alegria de viver vem do reconhecimento e apreciação das bênçãos de Deus. Paulo apela a 1. Tessalonicenses 5:16-18 a isto: "Alegrai-vos sempre, orai sem cessar, sede agradecidos em tudo, porque esta é a vontade de Deus em Cristo Jesus para convosco."

    Paz e confiança:

    A alegria cresce quando se confia em Deus e se experimenta a sua paz. Jesus diz em João 15:11
    "Disse-vos estas coisas para que a minha alegria permaneça em vós e a vossa alegria seja completa."

    Serviço e comunidade:

    A alegria também vem de servir os outros e de viver em comunidade. Paulo escreve em Romanos 12:15 "Alegrai-vos com os que se alegram e chorai com os que choram". Partilhar alegrias e tristezas com os outros enriquece a vida.

    Esperança para o eterno:

    A alegria do cristão está indissociavelmente ligada à esperança da vida eterna (Romanos 14:17):
    "Porque o reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, paz e alegria no Espírito Santo."

    Independência das circunstâncias:

    Alegria de viver não está ligada à prosperidade ou ao sucesso externos. Paulo diz da prisão em Filipenses 4:4: "Alegrai-vos sempre no Senhor; outra vez digo, alegrai-vos!"

    Difere, portanto, de uma alegria puramente mundana ou superficial, na medida em que é independente das circunstâncias externas.

    Assim, se nos é permitido regozijarmo-nos, e de facto devemos(!), devemos fazê-lo aceitando com gratidão o dom da alegria de Deus e não permitindo que o adversário nos faça sentir culpados e manche esta alegria divinamente concedida.

    Deus está interessado em que sejamos pessoas contentes, felizes e alegres e que, assim, levemos a Sua bondade e o Seu amor ao mundo com um sorriso radiante. É por isso que Ele nos dá oportunidades para relaxar, seja fazendo música, pintando, tirando fotografias, interagindo com animais e plantas. Se estivermos equilibrados, podemos cumprir as tarefas que nos são confiadas, porque somos saudáveis e temos força para o fazer sem nos excedermos e desequilibrarmos a nossa saúde.

    Assim, Deus não é de modo algum um desmancha-prazeres; de facto, Ele convida-nos claramente a ter alegria na vida! O facto de nos limitarmos, na escolha das oportunidades que nos trazem alegria, àquelas que não são compatíveis com os Seus valores não deve ser particularmente realçado...

    Um exemplo da minha vida

    Durante os meus tempos de liceu, sentia muitas vezes uma grande frustração, que descarregava tocando piano. De facto, era suposto(!) praticar determinadas peças. E foi precisamente essa prática, quer para isso quer para a escola, que foi o momento que me arruinou tudo.
    "O rapaz deve ter mais sorte do que nós, pais" pode ser um motivo nobre, mas não só não atinge o objetivo pretendido, especialmente se não corresponder - pelo menos aproximadamente - aos interesses da criança, como também é suscetível de tornar o futuro da criança muito difícil.

    Os vizinhos do bloco de apartamentos estavam sempre muito entusiasmados e perguntavam frequentemente à minha mãe que peça era, mas eram todas improvisações que reflectiam simplesmente o meu estado interior. Às vezes eram em tom menor, outras vezes em tom maior e outras vezes as duas tonalidades eram misturadas.

    Fazer música - livremente - era um escape para eu lidar melhor com os meus níveis de stress. Depois de as improvisações terem contribuído para a alegria dos vizinhos, eu até tinha feito uma boa ação nesse sentido. Mas, na altura, não me apercebi disso, nem sequer pensei nisso. A única coisa que era certa era que este fazer musical não era do interesse da minha mãe, mesmo que ela não soubesse que eu não estava a tocar as peças que estava a praticar.

    Pode colocar-se a questão de saber se este jogo foi a favor de Deus. Quando olho para as citações bíblicas acima, deduzo que Deus me está a acenar com a cabeça porque fiz algo de bom para a minha saúde durante este tempo, recuperei o equilíbrio e o jogo também trouxe alegria a outras pessoas.

    Excursus - Uma oferta imoral

    Imagine que está com um grupo de amigos e que planeou um fim de semana numa casa de férias. A perspetiva de muita diversão, boa comida e noites de convívio faz com que todos vibrem de ansiedade. Há também pessoas no grupo que são muito devotas e defendem os seus princípios religiosos. Mas, à medida que a noite avança, começa a surgir uma discussão.

    O plano

    Sexta-feira à noite. O grupo concordou em organizar uma pequena festa depois do jantar. Alguns dos amigos são a favor de uma festa até tarde da noite, com música, dança e um pouco de álcool. Outros, como tu, não são particularmente religiosos, mas tens a sensação de que beber em excesso e passar uma noite longa e tardia não são necessariamente as melhores decisões, especialmente se quiseres fazer muita coisa no dia seguinte.

    Um amigo crente, chamemos-lhe David, junta-se à conversa. Ele diz: "Tenho a sensação de que Deus nos está a mostrar uma forma clara de viver. Demasiadas festas, demasiadas bebidas, não conduzem a nada de bom. Deus quer que estejamos atentos a nós próprios e ao nosso corpo".
    David não é uma pessoa que seja fundamentalmente contra a diversão, mas para ele há uma linha que não quer ultrapassar se isso puder violar os valores de Deus, que ele também considera que vale a pena proteger como parte das suas convicções religiosas.

    A reação

    Alguns dos seus outros amigos reagem com compreensão, mas outros são bastante desdenhosos. Um amigo, que é mais descontraído em relação a temas religiosos, diz: "Vá lá, David, não é assim tão mau. É só um bocadinho de diversão. Podemos festejar sem nos arruinarmos. E, além disso, Deus não vai ficar zangado connosco se exagerarmos um pouco, pois não?" Um outro, que se descreve mais como agnóstico, interpõe-se: "Quem sabe o que Deus pensa? Acho que ele não se importa com algo como a nossa festa".

    Nesta altura, David sente-se desconfortável e diz: "Acho que é importante respeitarmo-nos a nós próprios e vivermos com moderação. E, para mim, isso significa manter-me fiel aos meus princípios no que diz respeito à diversão e ao lazer". Em silêncio, junta-se ao círculo, mas deixa transparecer que organiza a sua diversão de uma forma diferente.

    A decisão

    Depois de algumas discussões, o grupo decide limitar as celebrações, ou seja, nada de festas até altas horas da noite e nada de consumo excessivo de álcool. Alguns ficam desiludidos, mas os outros acabam por respeitar os desejos e as convicções de David. Concordam em passar a noite num grupo mais pequeno, sem muito barulho e consumo excessivo.

    Mas a questão mantém-se: Será Deus um desmancha-prazeres neste caso?

    Para David, Deus não é uma restrição, mas sim um guia. Ele não vê Deus como um desmancha-prazeres, mas como alguém que mostra o caminho para uma vida mais plena e respeitosa. Para ele, isto significa que se deve ser moderado em tudo o que se faz. Compreende que a diversão e o prazer são importantes, mas acredita que estas coisas não têm de estar em desacordo com uma vida boa e moral.

    Para os outros amigos, as coisas são um pouco diferentes. Sentem-se limitados no seu desejo imediato de diversão pelas convicções de David e perguntam-se se Deus é realmente um desmancha-prazeres neste caso. São da opinião de que a vida também deve ser desfrutada e questionam se é assim tão mau ultrapassar os nossos próprios limites de vez em quando.

    O debate de acompanhamento

    Na manhã seguinte, o ambiente é um pouco mais descontraído. A festa foi mais calma do que o planeado inicialmente, mas foi uma boa conversa e todos souberam respeitar-se mutuamente.

    Alguns amigos aperceberam-se de que era bom para eles deitarem-se cedo e descansarem no dia seguinte. Ficaram gratos ao David por os ter feito pensar, mesmo que no início discordassem.

    David sente-se satisfeito porque não só manteve os seus princípios, como também contribuiu um pouco para uma convivência mais respeitosa através da sua influência no grupo. Para ele, Deus não é o desmancha-prazeres neste caso, mas aquele que o ajuda a tomar decisões que conduzem a uma vida melhor a longo prazo.

    Conclusão

    O exemplo mostra como a pergunta "Deus é um desmancha-prazeres?" pode ser interpretada de diferentes formas num contexto quotidiano. Para uma pessoa, pode parecer que Deus está a estragar a sua diversão ao estabelecer limites morais. Para outros, porém, Deus é um guia que ajuda a tomar decisões que são boas para si e para os seus semelhantes a longo prazo.

    Neste caso, não se trata de proibir a diversão, mas sim de moderar e refletir sobre a forma como organizamos a nossa vida. Trata-se de perceber que a liberdade de se divertir também pode andar de mãos dadas com a responsabilidade e a atenção plena.

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